quarta-feira, 27 de junho de 2012

Shell


Nós queremos desmaiar em público, nossa dor precisa de plateia, como defende Milan Kundera. Mas será? Até onde nossos espectros de atenção cobiçam as pessoas? Necessitamos nos expor, mas até certo e distinto ponto. Queremos abrir o peito até o ponto em que as ligas musculares do íntimo não sejam reveladas, aquilo que ocultamos de todos até de nós mesmos, aquilo que não queremos que ninguém enconste. As manias, os sonhos, os pensamentos, os amores, as possibilidades, os desejos, a bizarrice mais absurda, o lado mais escuro do seu ser. Aquela coisa que pensou e se censurou na mesma hora, que desejou e balançou a cabeça dizendo para si mesmo: "você está ficando louco" aquilo que sonha mas não tem coragem de ir buscar.
Entrementes o que oculta de um lado revela o de outro, como alguém com uma manta pequena que tenta esconder o queixo do frio mas acaba deixando os pés de fora. Tampa-se algo para mostrar o outro. O rebuscado, o detalhado, o falso-intríseco, a dependência - palavra essa que é de nossa natureza, tendências desses mamíferos que não passam de bebezões, querendo outro seio quente para puxar com os lábios, outra pessoa para exaurir as forças. Queremos que nos carreguem, e por isso mostramos essa necessidade de plateia, cada um à sua própria maneira. Quando nus não passamos todos de bebês famintos, peludos e fedidos e abraçamos a nós mesmos nessa luta de "ei, olhe as minhas feridas!" "cuide de mim!" "oh é claro que eu preciso de você, estou carente" "não, não me deixe" "mantemos nossas mentiras até que algo melhor apareça". Uns mais que outros, outros menos que tantos.
Queremos ser abraçados como nossas mães nos abraçou, mas a vida nos vira de costas e diverte-se com nossas fraquezas para nos deixar no meio-fio, ainda molhados de sangue e pus, para mendigar uns aos outros. Um pouco de atenção por um pouco de atenção.
Dinheiro, beijo, conversa, xingamento, palavra.  .  .  Atenção, ela por ela mesma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário