sábado, 4 de agosto de 2012

Headache

Em certos pontos, sou só uma maçã que caiu de madura, não foi escolhida por nenhuma mão, só caiu e amassou. Agora existe a pressão de três noites sem dormir em paz, o choro acumulado, a ausência e as dores da falta de atenção e saúde. A morte adia seu tempo, fazendo-me sofrer a prestação e implorar por ela cada segundo mais.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Les deracines

A pele era estragada, o cabelo desarrumado, o senso de humor falso, o olhar vago. Parecia mais lesado que homem.
― Você, acorde, menino. Saia dos livros e caia na realidade. Desligue a música e arrume um emprego. Feche a alma e emburreça. Seja mais um amontoado de fracasso cívico e ambulante que perambula pelo mundo fazendo dinheiro por dinheiro. Esqueça de si mesmo e de quem é, deixe morrer o garotinho dentuço e sonhador que corria descalço no gramado e fazia bolhas de sabão. Perca-se de sua inocência e enterre suas memórias. Finja e por outros seja fingido. Embebede-se dos licores do momento e fume os tragos da decadência. Morra sozinho em uma mansão, morra sozinho em seu quitinete sufocante, mas morra sozinho. Ame mil mulheres por mil dias, mas ao chegar o tempo case-se com a mais fácil delas, tenha um único filho e passe o resto dos dias em contagem regressiva da sua vida. Vá ser quem não é, e não ser o que é.
― Pois não serei. O vento ainda me bate forte contra esse sistema de falhas construídas em falhas.
― Ora, moleque, não valse em tetos de vidro!
― Então não pise em minhas flores e em meus pés descalços!
― Vá obedecer ordens no imperativo, e se afogue em um clichê para ser igual.
― Para ter palavras como as suas? Esses frutos ilusórios de falsa liberdade, desalmados e podres seres? Somos todos humanos, fadados ao fracasso e a queda, se não o fossemos o não viveríamos pregados no chão. Ele é um amigo melhor que qualquer um destes que como você vivem. Em ruínas de humanidade! Em esgotos e becos de bruma suja, escondendo lobos em galinheiros de mais lobos. Armadilhas seguidas de armadilhas, aço contra aço, um mais fraco que o outro nessa eterna luta de egos gordurosos de barrigas pedantes. Esfregam-se nesses corpos consumíveis e capitalistas que trazem o preço já estampado nas roupas que usam, nos saltos que os elevam, nos bisturis que os cortam. Não, homem, eu prefiro o meu jardim.
― E até quando acha que pode viver isolado, rapaz? Até quando mente para si mesmo que não necessita de ninguém além de sua própria loucura e estas flores inférteis? Se já os sábios gregos defendiam que o homem nasce selvagem e a sociedade o doma!
― Bichos enjaulados, são todos vocês! Matam a si mesmos com as armas feitas de seus próprios ossos. Gritam por bananas verdes por trás de suas grades de mais ossos, e dormem em suas camas imundas de merda! São todos iguais.
O homem, sobranceiro, ergueu o rosto e cruzou os braços, fitando o rapaz de faces rubras de cólera em sua frente. Pálido e oblíquo, respondeu:
― A massa obedece os grandes que a faz grande. Não perca mais seu tempo como um eremita barbudo, ainda morrerá e ninguém ouvirá seus gritos de agonia. ― Entortando o chapéu, deu meia volta e caminhou, distanciando do rapaz.
― Antes ninguém me ouvir morrendo, do que todos querendo me matar. ― E o jovem virou-se para o oposto, aconchegando a flor que trazia no bolso do paletó e a afagando-a docilmente. ― D'abord il y avait la colere, et puis il y avait notre promesse de ne pas perdre le feu, de vivre debout et en movement.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Destes tristes fins


Há o frio e o resto do café. As repetições se acumulam e o prostam na posição do poeta que busca suas rimas, não há mais graça em sua existência cansada de eremita de si mesmo. O caminho que trilhou até aqui só lhe garantiu frutos amassados e solitários, ora venenosos, ora deleitantes e o fez mais sensível atrás da carcaça de pedra que o cobre. Há apenas a luz de vela e o tinteiro pela metade. As palavras são riscadas por linhas inteiras e arremessadas no lixo sem segundos pensamentos. Não foi o aprendizado ruim, mas o aprendiz. O vão e as raízes de sua ventura poética avançam por sobre seus músculos do coração, tomando o lugar da vida. Faz-te forte, homem, faz-te vil. Por entre as entranhas de se mesmo, de palavras ainda cabem mais mil. Há o sonho e a possibilidade, sobre uma balança instável. O dever o laceia, a consciência o escraviza, mas o medo o aterroriza. O medo de ter medo de temer. As inspirações caem no chão e escorrem por entre os dedos finos, vê então sua face refletida mas não consegue tocar-se.
E contenta-se com as migalhas.
Há o karma e o absinto. Entre as paredes de si mesmo, ele se prende e se sufoca sozinho. Dentro de si não há mais espaço para tantas mentiras e tantos eus que lhe roubam o pouco ar e as poucas rubricas de vida. Há o peso a leveza, e é essa leveza que o leva para o peso extremo de sua própria razão. O remorso corroi o íntimo e enferruja as relações, deixando nada além de uma caixa hermética.
E valsa no tablado de ácido.
Há a faca e o fósforo. Os ruídos do abismo ecoam com as onomatopeias demoníacas de sua alma, dando-lhe sentido. Os superegos se perdem em um só ego, e o super morre conforme os passos avançam. Há o erro e o erro, e o que tiver além dele se dissipa ao longo das palavras. Há a esperança e a dívida, mas nenhuma sobrevive em unilateralidade.
E se joga do penhasco do raciocínio.